O raciocínio parte da seguinte questão: é possível confundir céu e inferno? Sob quais condições seria possível confundir um com o outro? Para além da primeira impressão, como se dá a transição para dentro destes domínios? Ou seja, deve haver algum meio-termo existencial que nos permita elencar, ao mesmo tempo, a partir da mesma sensação e experiência, características infernais e celestes que estejam indiscerníveis à nossa intuição conquanto ainda se encontrem entremeadas? E, na ausência de um tal meio-termo existencial, seria plausível que houvesse uma sensação possível de ser desfrutada entre os dois extremos, e qual sensação seria essa?
Estas perguntas, logicamente, envolvem tanto uma definição de céu quanto uma definição de inferno.
Devemos abordar a necessidade dessas definições sob muitas formas. Céu e inferno podem tanto se referir a certos estados psicológicos ou físicos, quanto aos lugares que nossa consciência e alma passam habitar após o seu divórcio com o nosso corpo. Há menções a um submundo povoado pelos mortos em quase todas as culturas religiosas, assim como também céus em que as almas voam livremente. Contudo, a ideia de um inferno cheio de danações, ou de um céu repleto de recompensas, dependeria não apenas de algumas noções teológicas construídas pelo aparato intelectual que cuida de administrar o além-vida, mas também de uma um camada residual de afetos e experiências acumuladas pelos seres humanos ao longo do tempo. Referências a estes lugares existem em diferentes religiões, tanto no cristianismo quanto no budismo, zoroastrismo ou hinduísmo, mas sua paisagem, assim como sua metafísica, costuma variar – algumas coisas se perdendo ou sendo adicionadas conforme cada tradução. O que há, portanto, em comum entre eles?
Continuar lendo